quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Como formatar documentos escritos destinados a alunos disléxicos?


Este documento é o resultados de alguns estudos elaborados sobre esta matéria e da lei ainda em vigor (DL3/2008). Serve apenas como sugestão. Cada situação deverá ser alvo de reflexão.


sábado, 26 de agosto de 2017

Cartas da mãe e do filho disléxico


A aventura de ser mãe de um disléxico
Carta da mãe do Pipo

Ser mãe de um disléxico é uma aventura única! Estávamos em março/abril de 2000 e o Felipe (ou Pipo como preferirem), meu filho, com 6 anos na época, não queria ser alfabetizado. Ele estava no pré-escolar e recusava-se fazer os trabalhos de casa, não se interessando por quaisquer atividades que o levassem à leitura de uma simples palavra ou texto. Na época, estudava numa escola pequena perto de casa. O que fazer? Transferi-o para uma escola maior, o colégio alemão, onde não alfabetizavam os alunos no Pré, mas sim na fase seguinte. O período de calmaria durou pouco. Quando chegou a época da alfabetização, o problema agravou-se.
Como sou professora, não compreendia como uma criança dos 6 para os 7 anos, que jogava xadrez comigo (e arrasava comigo!), podia não aprender a fazer uma conta de adição ou ler qualquer palavra por mais simples que fosse. Tentei de tudo: montar um caderno com palavras cruzadas da Mónica e do Cebolinha, estudo dirigido de matemática, mas vi que era somente um paliativo. O problema maior persistia.
Comecei então a fazer revisões de todas as lições de casa com ele todos os dias… Houve poucos progressos… Daí, descobri que a paciência que eu tinha com os meus alunos universitários, não era a mesma com meu próprio filho. A minha angústia aumentava a cada dia. O que fazer? Este era um dos meus problemas, visto que estava a passar por uma situação delicada: a minha separação do pai dele.
Nesse meio tempo conheci uma escola de reforço perto de casa (Núcleo Estudantil) cujos proprietários – Prof. Mário e Prof.ª Roseli foram o meu braço direito com o Felipe. Devo-lhes o sucesso académico do meu filho! Tirei-o do colégio alemão para uma escola menor. O Felipe já estava na 3.º ano, passando de ano, mas com muito sacrifício. Estudar não pode ser tão massacrante!
Após diversas conversas com a assistente pedagógica da escola, levei-o ao neurologista. Diagnóstico: distúrbio de atenção sem hiperatividade e dislexia. Levei o Felipe ao Dr. Erasmo Barbante Casella um neurologista infantil que me alertou que a maior incidência de disléxicos e TDA (PHDA) ocorre em gravidezes tardias, parto demorado e hereditariedade – o Felipe se encaixava nos três! (Ele nasceu depois de 13h de trabalho de parto, de uma mãe, na época, de 38 anos de idade e um pai que apresentava certas dificuldades na época escolar.)
Havia ainda a necessidade de confirmar o diagnóstico o que fiz com especialistas da área. Com diagnóstico na mão, descobri que na Zona Norte de São Paulo, onde moro, não havia escolas preparadas para receber alunos fora dos padrões “normais”.
Na pequena escola, o Felipe permaneceu até ao 5.º ano. No final deste ano, e já desgostosa da falta de atenção que meu filho recebia na escola, fui conversar com a orientadora educacional do Mackenzie e, na posse de todos os pareceres possíveis, perguntei-lhe: é possível cuidar do meu filho, nestas condições? E ela disse-me: “Sem problemas!” Daí, matriculei-o no Colégio Presbiteriano Mackenzie e ele iniciou em 2006 o 6.º ano.
Dentro do Mackenzie, e com reforço escolar no Núcleo Estudantil, a minha vida e a vida do Felipe mudou completamente! Tenho somente um arrependimento na vida: Não ter levado o meu filho para o Mackenzie quando o diagnóstico apareceu! Bem, não se pode ser perfeito em tudo.

Dislexclub.com

(Texto com adaptações)

A aventura de ser disléxico
Carta do Pipo

Há um tempo lancei a seguinte pergunta num grupo sobre dislexia de que faço parte no Facebook: “Qual é a vossa expectativa quando a semana começa e o vosso filho vai para a escola?” Tomando como base as minhas próprias experiências de vida, confesso que não esperava respostas muito otimistas. Não vou generalizar, houve pessoas com pensamentos muito positivo e animadores, mas são a minoria. Grande parte dos comentários andava entre “Ah, não, tudo de novo, não!”, “As aulas mal começaram e eu quero já o fim de semana!”, “O início é sempre complicado como em todas as outras semanas!”, e por aí fora. O meu objetivo com este texto é passar-vos umas ideias que deram certo comigo. E além disso,  eu não quero que vocês simplesmente entrem bem na sala de aula, quero que entrem... arrasando!
Façam a vocês mesmos a seguinte pergunta: “Estudar para quê?” Nós, os disléxicos, perdemos rapidamente o foco quando uma coisa não nos interessa. Então, muito mais importante do que a dificuldade causada pela dislexia, é a motivação para estudar.
Então, o que fazer? Bem, isto não depende só dos outros, temos de nos motivar a nós mesmos! Pensem que a escola é o vosso QG (Quartel General), onde vocês vão ser treinados para conquistar coisas grandes lá fora! Por exemplo: Hoje, eu estudo publicidade na faculdade, nunca mais na minha vida vou estudar química, física e biologia – isto quer dizer que estas disciplinas foram inúteis para mim? Claro que não!
Estudar matérias que definitivamente não eram a minha praia, além de abrir a mente para coisas novas, fez com que eu treinasse a minha persistência  para enfrentar as mais adversas situações do dia-a-dia de trabalho.
Se vocês são disléxico, provavelmente já passaram ou passam por alguns problemas dentro da sala de aula: notas baixas, recuperação, depender do conselho de turma, passar de ano sempre no limite, ansiedade, stress e por aí fora – sei bem disso, porque eu também já por aí passei.
Então, o que fazer? Pode parecer estranho o que vou dizer agora, mas a melhor forma de deixar de ser o pior aluno da turma é ser o melhor aluno da turma. Como se faz isto?
             1.º. Encarar todos os testes como se fossem uma prova final – nada de nos enganarmos no princípio e tentarmos recuperar só nos fins dos períodos, porque não vai resultar.
2.º. Quando o professor mandar fazer um trabalho, este deve ser logo feito – nada de deixar tudo para as vésperas.
3.º. A dislexia dá-nos muitos dons, os principais são a Criatividade e a Persistência, então usem e abusem deles!
Pensemos no seguinte: nem todos os alunos que tiram 3 ou 10 são alunos de nota 3 ou 10; e nem todos os alunos que tiram 2 ou 8 são alunos de nota 2 ou 8. Se vocês tiraram 2 ou 8, mas se se esforçaram muito e deram o vosso máximo, tudo bem, vocês melhoram da próxima vez. Agora, se vocês só folhearam o caderno, deram uma olhadela na matéria e foram para o Facebook (ou o que for), quando tiverem uma nota baixa, não chorem da injustiça, nem reclamem da escola ou do professor. Todos temos de fazer a nossa parte! A escola também.
Vou contar-vos uma situação pessoal.
No colégio onde estudei, o ano letivo era dividido em 1.ª etapa, 2.ª etapa e 3.ª etapa, sendo que em cada uma delas havia uma provinha (prova intermédia) e um provão (prova global). Quando estava no início, acabei a 1.ª etapa com 5 notas vermelhas (para desespero meu e da minha mãe). Foi aí que comecei a empenhar-me mais, aumentei as minhas aulas de reforço, e comecei a estudar pelo menos 15 minutos por dia. Acabei a 2.ª etapa com apenas duas notas abaixo da média, sendo que uma delas (história) precisava de muito pouco para recuperar. Bom, na 3.ª etapa, a coisa foi mais emocionante. A outra disciplina em que precisava de recuperar era geografia, devido a uma certa falta de organização minha na entrega de alguns trabalhos. Precisava de tirar uma nota alta para passar. Pensam que eu desisti por isso? Melhorei aquilo que estava mau e aperfeiçoei aquilo que funcionava na minha forma de estudar. Quando recebi a prova, tinha tirado uma nota acima daquilo que precisava.
Depois de toda a correria do meu 1.º ano no colégio, eu tinha aprendido uma lição muito importante: aproveitar bem o meu tempo. Com isto na cabeça, os meus 2.º e 3.º anos foram mais tranquilos, em nenhum dos dois tive notas abaixo da média.
Como eu disse antes, não há nenhum problema em ser mau em algumas matérias, o problema é o que vocês fazem em relação isso.
Duas coisas que funcionaram bastante bem comigo:
1.ª. AULAS PARTICULARES DE TREINO: fiz aula de reforço dos 10 aos 17 anos, e foi um dinheiro muito bem empregue pela minha mãe. A maior contribuição que me deram, além dos conteúdos, foi que aqueles professores sempre esperavam mais de mim, eles realmente acreditavam em mim, tinham expectativas maiores para mim.
2.ª. ENVOLVER-SE COM PESSOAS INTELIGENTES: já perceberam que os marrões são as pessoas mais populares da escola na época das provas, pode ser que durante o ano ninguém troque uma palavra com eles, mas, na correria do final dos períodos, eles são sempre disputados. Como me ensinou a minha mãe: “Diz-me com quem andas, e eu dir-te-ei quem és”, desde os primeiros dias de aulas, eu fazia amizade com os marrões da sala, para que, quando chegasse a aflição, eu tivesse com quem contar (algumas dessas amizades eu ainda cultivo até hoje).
Vou dar-vos um conselho que eu fazia em todos os meus primeiros dias de aula: chegava junto do professor depois da aula e dizia-lhe: “Professor, tudo bem? Só queria dizer-lhe que eu sou disléxico e, de vez em quando, as matérias não entram na minha cabeça (não se zangue comigo nesses momentos), só o queria informar de que vou conversar muito consigo quando isto acontecer, pode ser?” O professor vai olhar-vos de uma forma diferente, pois ele viu que vocês confiam nele.
Outro caso muito interessante que me aconteceu foi quando, num dia que recebemos as notas das provas, uma colega me perguntou “Pipo, assim não vale, tu só tens boa nota porque fazes testes diferentes dos nossos”. A resposta que me veio de repente foi: “Pois é, quem te mandou nascer certinha?” E a partir daí, as pessoas vinham perguntar-me sobre dislexia, e foi uma bela porta de entrada para que eu começasse a consciencializar o pessoal sobre o que era e como funcionava a dislexia.
Talvez vocês se perguntem: “Ok, mas consciencializar os meus amigos vai trazer-me algum beneficio?”, para vocês talvez não (a não ser que ficam a conhecer-vos melhor), mas se esse amigo encontrar outro disléxico ao longo da vida, ele vai poder ajudá-lo.

Dislexclub.com

(Texto com adaptações)

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Consciência fonológica e princípio alfabético



Dois aspetos fundamentais na aprendizagem inicial da leitura, mas também na reeducação de alunos disléxicos: a consciência fonológica e o principio alfabético. Afinal, o que são?

A consciência fonológica é a habilidade que o ser humano tem de reconhecer e manipular os sons da fala (refletir), depois de os ter adquirido inconscientemente à medida que os foi ouvindo nos primeiros anos de vida. Ora, se tudo correr bem, no início da aprendizagem da leitura, depois da tal aquisição inconsciente, o indivíduo começa a ter consciência de que existem várias combinações de sons que formam palavras diferentes, isto é, adquiriu Consciência Fonológica: as palavras passam assim a ser entendidas como construções formadas  por partes que podem ser segmentadas e manipuladas. Este processo bem adquirido constituiu um pré-requisito para a fase da aprendizagem da leitura e escrita, em que o indivíduo terá de dominar um outro processo importante: o princípio alfabético.

O Princípio Alfabético é a relação existente entre som e letra, isto é, entre fonema e grafema. O indivíduo só domina o princípio alfabético quando entender que os sons das letras são os sons da fala, para isso tem de adquirir a capacidade de analisar essa relação.

Os indivíduos que têm estes dois processos bem adquiridos não terão dificuldade em aprender a ler. Mas acontece que alguns, por razões várias, não os adquirem com a mesma rapidez que a maioria, necessitando de uma segunda oportunidade; outros, para além dessa segunda oportunidade, precisam de um treino acrescido com um programa estruturado (disléxicos).

É preciso no entanto perceber que o ato de pensar e manipular conscientemente os fonemas exige competências que excedem a consciência fonológica e o domínio do princípio alfabético.